Nos idos dos anos 70, houve uma novela chamada BRAVO, não me recordo dela em si, mas sua trilha sonora, aquele Long Play de Vinil foi o meu primeiro contato com a obra deste russo. História de Três Amores era a primeira faixa do lado A daquele disco. E para voltar no tempo e sentir um pouco da nostálgica época da vitrola e daquelas bolachas pretas. Falarei de Sergei Vassilievitch Rachmaninoff. - Optei pela grafia por esta, visto que era a forma com que o autor assinava na forma ocidental. Entretanto encontram-se várias grafias para o seu nome e sobrenome: Sergey ou Sergej, Rachmaninov, Rachmaninow, Rakhamaninov e Rakhamaninoff.
"Minha visão é um produto do temperamento, assim como a música russa. Nunca tentei, conscientemente, escrever música russa ou qualquer outra espécie de música".
Nikolai Zverev |
Em 1892, completou seu Concerto
para Piano No. 1 (Op. 1, 1891), que ele revisou em 1917. Na mesma época, compôs
um conjunto de peças para piano, Morceaux de Fantaisie (Opus 3) na qual o
Prelúdio em Dó-sustenido Menor era parte integrante e que se tornou famoso. De
acordo com Francis Crociata, o compositor ficou confuso com a fascinação do
público por essa composição. Esta peça de piano estabeleceu o estilo e
temperamento de sua obra: escura, melancólica e chocante. Rachmaninoff compunha
de maneira fortemente dramática e romântica, assim como o seu grande antecessor
russo, Tchaikovsky, em breve falaremos dele.
No mesmo ano, formou-se no
conservatório de Moscou com distinção como pianista e compositor, a Ópera Aleko
em um ato, baseada num libreto de Nemirovich-Danchenko e inspirada no poema do
célebre escritor Aleksander Puchkin, apresentada no Teatro Bolshoi em 09 de
maio de 1893, foi sua peça de formatura e rendeu uma medalha de ouro como
premiação.
Ainda naquele ano, escreveu
“O Rochedo”, baseado num poema de Lermontov e no conto “Durante a Viagem” de
Tchekov, que relata o breve romance entre um homem maduro e uma jovem em uma
pousada, Rachmaninoff dedicou a obra ao autor da narrativa.
Stravinsky descreveu
Rachmaninov como uma "carranca de seis pés e meio", Sergei era muito
alto, quase dois metros de altura, e em público mantinha sempre uma expressão
severa, com mãos grandes e dedos muito longos, cruzava o teclado do piano
melhor do que qualquer outro pianista. Sua figura, para aqueles que o conheciam
na intimidade, era outra, tinha um ótimo senso de humor e apreciação por boa
comida e bom vinho.
Cesar Cui |
Alexander Glazunov |
Em 27 de Março de 1897 estreou a sua Sinfonia nº 1 em Ré Menor Opus 13, regida por Alexander Glazunov, foi um fracasso, a obra foi comparada pelo crítico Cesar Cui “como a dez pragas do Egito admirada apenas pelos inatos de conservatório de música no inferno”, isto o levou a uma forte depressão, incapaz de compor durante quase três anos, trabalhando exclusivamente como pianista. Dizem que Glazunov estaria bêbado...
Nikolai Dahl |
A crise criativa foi resolvida através de ajuda médica, compondo em 1900 seu Concerto Para Piano nº 2, Opus 18, dedicado ao seu médico Dr. Nikolai Dahl, um pioneiro da hipnose em Moscou que conseguiu devolver a sua autoconfiança, na estreia o próprio Rachmaninoff foi o solista, e a peça é considerada como uma de suas composições mais populares.
Natalie e Sergei Rachmaninoff |
Após várias apresentações
como maestro, Entre 1904 e 1906, foi regente e diretor musical do Teatro
Bolshoi. A agitação política contínua, greve de bailarinos e outros entreveros,
fizeram com que pedisse demissão do teatro, após o que ele foi para a Itália
(em Florença e depois em Marina di Pisa) até julho. Ele passou os três invernos
seguintes em Dresden, na Alemanha, trabalhando intensivamente como compositor e
retornando à familiar Ivanovka apenas nos verões.
Em Dresden, escreveu o poema
sinfônico A Ilha dos Mortos (1909) e o concerto N.3 (1909), este escrito
especialmente para sua primeira viagem aos Estados Unidos, onde foi bem recebido
e convidado a permanecer naquele país, mas preferiu retornar a Moscou.
Entre 1901 e 1917, viveu o
seu momento mais feliz. Como compositor havia desenvolvido uma obra pianística
excelente:
- Entre 1901 e 1903 – Prelúdios Op.23,
- 1907 - Sonata nº 1 em Ré menor,
- 1910 - Prelúdios Op. 32,
- 1911 - Estudos Op. 33
- 1917 - Estudos Op. 39, além
das obras orquestrais e vocais.
Em 1911, foi diretor da
Orquestra Filarmônica de Moscou, assim durante dois anos suas obrigações o
mantiveram na capital russa.
Assim que se desligou do
cargo retomou as suas viagens, e em 1913 na cidade de Roma, compôs Os sinos Op.
35, uma sinfonia para orquestra, coro, e três solistas: uma soprano, um tenor e
um barítono, baseou-se no poema de Edgard Allan Poe. Assim como o poema, a obra
apresentava quatro momentos, as etapas da vida humana, representadas através da
sonoridade de quatro tipos de sino, que tentou reproduzir através da orquestra.
Os sinos de prata do primeiro movimento: o Nascimento;
Os sinos de casamento: a Cerimônia Nupcial;
Os sinos de alarme: o Amadurecimento; por fim
Os sinos de ferro: retratando
a morte.
Rachmaninoff considerava esta
a sua obra mais primorosa.
OS SINOS – Edgard Alan Poe
Escuta: nos renós tilintam
sinos
argentinos!
Ah! Que de mundo de alegria o
som cantante prenuncia!
Como tinem, lindo, lindo,
No ar da noite fria e bela!
Vão tinindo e o céu inteiro
se constela,
Florescente, refulgindo
Com deleites cristalinos!
Dão ao Tempo uma cadência tão
constante
Como um rúnico descante,
Com os tintinabulares,
pequeninos sons, bem finos,
Que nascendo vão dos sinos,
Sim, dos sinos, sim, dos
sinos,
Saltitantes, bimbalhantes,
dentre os sinos.
II
Escuta: em núpcias vão
cantando os sinos,
Áureos sinos!
Quantos mundos de ventura seu
tanger nos prefigura!
No ar da noite, embalsamado,
Como entoam seu enlevo
abençoado!
Tons dourados, lentas notas
Concordantes...
E tão límpido poema aí flutua
Para as rolas que o escutam,
divagantes,
Vendo a lua!
Volumoso, vem das celas
retumbantes
Todo um jorro de eufonia
Que se amplia,
"O futuro é belo e
bom!"
- clama o som,
Que arrebata, com em êxtases
divinos,
No balanço repicante que lá
soa,
Que tão bem, tão bem ecoa
Na vibrante voz dos sinos,
sinos, sinos,
Carrilhões e sinos, sinos,
No rimado, consonante som dos
sinos.
III
Escuta: em longo alarma
bradam sinos,
Brônzeos sinos!
Ah! Que história de agonia,
turbulenta, se anuncia!
Treme a noite, com pavor,
Quando os ouve em seu bramido
assustador.
Tanto é o medo que, incapazes
de falar,
Limitam-se a gritar,
Em tons frouxos, desiguais,
Clamorosos, apelando por
clemência ao surdo fogo,
Contendo loucamente com o
frenesi do fogo,
Que se lança bem mais alto,
Que em desejo audaz estua
De, no empenho resoluto de
algum salto,
(sim! agora ou nunca mais!),
Alcançar a fronte pálida da
lua!
Oh! Os sinos, sinos, sinos!
De que lenda pavorosa, de
alarmar,
Falam tanto?
Clangorantes, ululantes,
graves, finos,
Quanto espanto vertem,
quanto,
No fremente seio do ar!
E por eles bem a gente sabe -
ouvindo
Seu tinido,
Seu bramido -
Se o perigo é vindo ou findo.
Bem distintamente o ouvido
reconhece
Pela luta,
Na disputa,
Se o perigo morre ou cresce,
Pela ampliante ou
descrescente voz colérica dos sinos,
Badalante voz dos sinos,
Sim, dos sinos, sim, dos
sinos,
Do clamor e do clangor que
vêm dos sinos!
IV
Escuta: dobram, lentamente,
os sinos,
Férreos sinos!
Ah! Que mundo pensares tão
solenes põem nos ares!
Na silente noite fria,
Quando a alma se arrepia
À ameaça desse canto
melancólico de espanto!
Pois em cada som saído
Da garganta enferrujada
Há um gemido!
E os sineiros (Ah! essa gente
Que, habitando o campanário,
Solitário,
Vai dobrando, badalando a
redobrada
Voz monótona e
envolvente...),
Quão ufanos ficam eles,
quando vão
Tombar pedras sobre o humano
coração!
Nem mulher nem homem são,
Nem são feras: nada mais
Do que seres fantasmais.
E é seu Rei quem assim tange,
É quem tange, e dobra, e
tange.
E reboa
Triunfal, do sino, a loa!
E seu peito de ventura se
intumesce
Com os hinos funerários lá
dos sinos;
Dança, ulula, e bem parece
Ter o Tempo num compasso tão
constante
Qual de rúnico descante,
Pelos hinos lá dos sinos!
Ah! Dos sinos!
Leva o Tempo num compasso tão
constante
Como em rúnico descante,
Pela pulsação dos sinos,
A plangente voz dos sinos,
Pelo soluçar dos sinos!
Leva o Tempo num compasso tão
constante,
Que a dobrar se sente, ovante,
Bem feliz esse rúnico
descante,
Com o reboar que vem dos
sinos,
A gemente voz dos sinos,
O clamor que sai dos sinos,
A alucinação dos sinos,
O angustioso,
Lamentoso, lutuoso som dos
sinos!
São João Crisóstomo |
A
Revolução Bolchevista Russa de 1917 viu-se forçado a fugir para o exílio com
esposa e duas filhas. Abandonou sua produção como compositor, retomando sua
carreira como concertista de piano, fixa residência em Nova Iorque, nos Estados
Unidos até 1928. Durante sete anos, passou períodos na França e na Suíça, até o
seu retorno definitivo aos Estados Unidos em 1935.
Thomas A. Edison |
Em 1919, fez gravações para Thomas Edison usando um piano vertical o qual o inventor admitiu ser de qualidade inferior; entretanto, os discos renderam fama ao compositor. No ano seguinte ele assinou um contrato exclusivo com a Victor Talking Machine Company e continuou a fazer gravações com a Victor até fevereiro de 1942.
Nessa época produziu poucas obras, por passar parte de seu tempo com sua família, e devido à saudade de sua terra natal; ele sentiu que abandonar a Rússia foi como deixar para trás sua inspiração. Voltou a compor apenas em 1926, quando escreveu o Concerto para piano nº 4, considerado o menos interessante de seus concertos, iniciou a sua composição ainda na Rússia, e ao concluir deixou-se influenciar pela a música americana.
Variações
sobre um Tema de Corelli foi escrita em 1931, no mesmo ano, juntamente com
outros exilados russos, foi um dos fundadores de uma escola de música em Paris
que posteriormente ganharia seu nome, o Conservatoire Rachmaninoff.
Rapsódia
sobre um tema de Paganini composta em 1934, homenagem ao grande virtuose da
história da música romântica, é atualmente um dos seus trabalhos mais
conhecidos. Entre os anos de 1935 e 1936
compôs a Sinfonia nº 3 foi a primeira obra orquestral desde a Ilha dos Mortos
em 1909, uma obra influenciada pela linguagem musical americana. O tema morte
aparece em seu canto de cisne, composto em 1940, foram Danças Sinfônicas, seu
último trabalho completo, faz referência ao Alliluya da obra Vésperas e ao
primeiro tema de sua Primeira Sinfonia. O nome original era Danças fantásticas,
com parte de sua música aproveitada do balé Os citas iniciado em 1915 que não
chegou a ser concluído. Trata-se de uma obra de profundo lirismo. Suas mais
belas nostálgicas e melancólicas melodias estão presentes nestas três obras.
Rachmaninoff
caiu doente durante uma turnê de concertos em 1942, e foi subsequentemente
diagnosticado com um melanoma maligno, mesmo assim atraído por atores e
diretores russos que proliferavam em Hollywood, mudou-se para Beverly Hills. Devido
ao seu estado de saúde, o compositor foi levado para Nova Orleans. Ciente da
gravidade da doença, pediu uma enfermeira russa e um rádio que lhe permitisse
ouvir música emitida de Moscou.
Em
1 de Fevereiro de 1943, Sergei e Natalie Rachmaninoff tornaram-se cidadãos
americanos.
Seu último recital, em 17 de fevereiro de 1943 no Alumni Gymnasium da Universidade de Tennessee em Knoxville, profeticamente performando a Sonata No. 2 em Si Bemol Menor de Chopin, que contém a famosa marcha fúnebre. Uma estátua comemorativa do último concerto de Rachmaninoff existe no Parque de World's Fair, em Knoxville.
Seu último recital, em 17 de fevereiro de 1943 no Alumni Gymnasium da Universidade de Tennessee em Knoxville, profeticamente performando a Sonata No. 2 em Si Bemol Menor de Chopin, que contém a famosa marcha fúnebre. Uma estátua comemorativa do último concerto de Rachmaninoff existe no Parque de World's Fair, em Knoxville.
Pessoas que o conheceram nesta época diziam que era homem mais triste que já haviam visto. Em 1961, o maestro Ormandy declarou:
Rachmaninoff
foi, na realidade, duas pessoas. Ele odiava sua própria música e estava
geralmente infeliz ao executá-la ou conduzi-la para o público, então é este
lado triste que o público conhece. Entretanto, entre seus amigos mais próximos,
ele tinha um senso de humor muito bom e tinha um bom espírito.
Residência onde faleceu Rachmaninoff |
Desde
1931 a reprodução de sua música era proibida pelas autoridades russas, por
considerá-la perigosa e burguesa, após a sua morte, um movimento para recuperar
a obra de Rachmaninoff como parte do patrimônio russo teve início. Sua música
passou, a partir de então, a se impor com força nos círculos musicais
soviéticos.
Sua
produção teve forte declínio, entre 1892 e 1917, enquanto viveu principalmente
na Rússia escreveu trinta e nove composições com números opus. Durante o exílio, entre 1918 e 1943, completou
apenas seis.
Embora
tenha sido quase toda escrita no século XX, a música de Rachmaninoff é
classificada como Romântica do século XIX.
Curiosidades:
Em 1923 Rachmaninoff se introduziu no pioneirismo da aviação ao estudar os desenhos de Igor Sikorsky e, de acordo com o filho de Sikorsky, doou uma quantia de $5000 e disse "eu acredito em você, confio em você, pague-me de volta somente quando puder, vá, comece a fazer seus aviões".
Eric Carmen |
A canção popular norte americana, "All by Myself" (cujo sucesso foi escrito por Eric Carmen e gravada em 1975, e mais tarde por Sheryl Crow (1994) e Celine Dion (1996), é um arranjo temático do II movimento - Adagio Sostenuto - do Concerto para Piano No. 2, Opus 18, em dó menor de Rachmaninoff.
Eric Carmen também escreveu
Never Gonna Fall in Love Again, desta vez, se baseando no III
movimento---Adagio---da Sinfonia Nº2, Opus 27, em mi menor, também de
Rachmaninoff. (ambas encontram-se no link abaixo)
Em 1965, Robert Wright e George Forrest, os escritores de Kismet, escreveram um musical chamado "Anya", usando a música de Rachmaninoff como base.
O Concerto para piano n.º 2 de Rachmaninoff é mencionado no filme The Seven Year Itch ("O Pecado Mora ao Lado") de 1955, que estrelava Marilyn Monroe.
A Rapsódia Sobre um Tema de Paganini foi trilha sonora do filme Somewhere in Time ("Em Algum Lugar do Passado"), de 1980.
O filme Shine de 1996, sobre a vida do pianista David Helfgott, gira em torno do Concerto para Piano No. 3 de Rachmaninoff.
O concerto para piano n.º 2 foi uma das músicas preferidas pela Princesa Diana. Segundo o livro "Diana crônicas íntimas" de Tina Brown, a princesa costumava ouvi-la ao escrever cartas e em momentos de descanso.
A "Sinfonia No. 3" é brevemente mencionada no filme "Homem de Ferro 2", de 2010, como "a Terceira de Rachmaninoff", pelo vilão Justin Hammer.
Para ouvir e copiar as obras do autor acesse ao link abaixo:
https://drive.google.com/drive/folders/0B9F356bpnhA-eGJyZWkxOFR4cHc?resourcekey=0-9zEXfLIHb6C3633qN8azTg&usp=sharing
Nenhum comentário:
Postar um comentário