Faço esta postagem para
cobrir a lacuna da semana anterior, e principalmente para homenagear um blog
que sempre frequento e me alimento com obras e textos maravilhosos.
Assim sendo a partir do
próximo parágrafo, nada será escrito por mim, apenas reprodução do texto
apresentado por Vassily Genrikhovich, no blog http://pqpbach.sul21.com.br , com a
devida permissão.
Postagem original:
http://pqpbach.sul21.com.br/2015/10/18/terezin-theresienstadt-anne-sophie-von-otter-bengt-forsberg-christian-gerhaher-daniel-hope/#comment-44899
http://pqpbach.sul21.com.br/2015/10/18/terezin-theresienstadt-anne-sophie-von-otter-bengt-forsberg-christian-gerhaher-daniel-hope/#comment-44899
Este magnífico álbum seria
tocante mesmo sem as circunstâncias que, a seguir, passo a lhes descrever – e
se o leitor-ouvinte é daqueles que prefere apreciar apenas o que escuta, sem se
abalar com circunstâncias extramusicais, sugiro que passe direto ao download.
A fortaleza austro-húngara de
Theresienstadt (em tcheco, Terezín), foi criada no século XVIII nas
proximidades de Ústí nad Labem, ao norte de Praga. Afora sua função defensiva,
também serviu como centro de detenção para prisioneiros políticos, mas foi
durante o sombrio período da ocupação alemã da Boêmia (1939-1945) que o nome de
Terezín foi definitivamente escrito na História da Infâmia.
“Todos tinham fome” – Liana Frankl, 9 anos |
Depois da anexação do
território tcheco dos Sudetos (1938) e de garantir a influência sobre o
estado-fantoche da Eslováquia (1939), o Reich transformou o restante do
território da então Tchecoslováquia no Protetorado da Boêmia e Morávia,
nominalmente autônomo e governado por tchecos colaboracionistas. Na prática,
quem mandava no Protetorado era um Reichsprotektor, cargo que coube, entre
outros, a dois dos mais truculentos membros dos quadros do Partido Nazista:
Richard Heydrich (assassinado em 1943) e Wilhelm Frick (executado em Nürnberg
em 1945).
Josef Novak, 7 anos |
Tão logo tomaram as rédeas do
poder, os nazistas começaram a esmagar os movimentos de resistência e expulsar
os então mais de cem mil judeus tchecos de suas residências. A maior parte
deles foi parar na cidadela de Terezín, que rapidamente viu sua população
inflar para quase sessenta mil pessoas, amontoadas em condições degradantes e
num espaço preparado para receber menos de sete mil. Além dos judeus da Boêmia,
Morávia e Eslováquia, Terezín também recebeu deportados da Alemanha, Áustria,
Países Baixos e Dinamarca, bem como prisioneiros de outros países.
Helga Weiss, 13 anos |
Enquanto a fome, o frio e as
epidemias ceifavam vidas entre os prisioneiros, o eficiente aparato de
propaganda nazista vendia a imagem de Terezín como uma cidade-modelo, em que os
judeus viviam em liberdade e celebravam sua cultura dentro do Reich: o emblema
de um tratamento humano e respeitoso que era o antônimo exato do que recebiam.
Numa ocasião especialmente infame, os nazistas “embelezaram” Terezín para uma
inspeção da Cruz Vermelha e para um filme de propaganda, amontoando os
prisioneiros famélicos e doentes em galpões para deixar à vista tão só os
pouquíssimos internos em estado razoável de saúde. O resultado da medida, no
auge de uma epidemia de tifo, foi mortífero.
“Não no gueto” – Dorita Weiser, 9 anos |
Com o advento da “Solução
Final”, os guetos foram evacuados, e seus moradores, transportados para campos
de extermínio. Além das 33.000 mortes devidas às péssimas condições de vida em
Terezín, outras 88.000 pessoas que por lá passaram foram levadas para
Auschwitz-Birkenau, Treblinka e Sobibor, ao encontro da morte. No total, das
mais de 150.000 vítimas do fascismo que viveram em Terezín, menos de 18.000
sobreviveram – entre os quais apenas 240 das 15.000 crianças.
Ella Liebermann, 16 anos |
Apesar da extrema dureza da
vida no gueto, e dos abusos e censura rigorosa dos nazistas, a vida e a Arte
floresceram em Terezín tanto quanto puderam. Artistas deportados continuaram a
escrever, compor, pintar e esculpir suas obras. A pintora Friedl
Dicker-Brandeis, notavelmente, deu aulas de Pintura e Desenho para muitas
crianças, com o intuito de aliviar-lhes a opressão em que viviam. Estes jovens
artistas, que em sua maioria encontraram a morte nos anos subsequentes,
deixaram para a posteridade um pungente legado que não só descreve melhor do
que quaisquer palavras os horrores que presenciaram, mas que também preservou
seus nomes para a posteridade. Alguns destes preciosos desenhos, a um só tempo
tocantes e perturbadores, ilustram esta postagem.
Ella Liebermann, 16 anos |
Sensibilizada com a história
de Terezín, a diva sueca Anne Sofie von Otter rodeou-se de colaboradores para
produzir este disco, inteiramente devotado a obras compostas por prisioneiros
do gueto.
Se algumas delas transpiram alegria, serenidade e escracho, é difícil nossas faringes não se apertarem ante a constatação de que a maior parte de seus compositores faleceu em 1944 – o ano da liquidação de Terezín. O que à primeira vista parece uma colagem com os gêneros mais diversos – de canções de cabaré a Lieder em tcheco e em iídiche, e até uma sonata para violino solo – ganha uma coesão admirável graças às interpretações muito sensíveis e reverentes.
Anne Sofie von Otter |
Se algumas delas transpiram alegria, serenidade e escracho, é difícil nossas faringes não se apertarem ante a constatação de que a maior parte de seus compositores faleceu em 1944 – o ano da liquidação de Terezín. O que à primeira vista parece uma colagem com os gêneros mais diversos – de canções de cabaré a Lieder em tcheco e em iídiche, e até uma sonata para violino solo – ganha uma coesão admirável graças às interpretações muito sensíveis e reverentes.
No fim, ao extinguir-se a
última nota do violino, o silêncio cala fundo, e é como se uma voz nos sussurrasse:
– Esquecer… é repetir.
NUNCA, pois, esqueçamos
Terezín.
“A chegada do trem com deportados” – Edita Pollak, 9 anos |
Os músicos que acompanham a mezzo-soprano Anne Sofie von Otter no álbum:
Christian Gerhaher, barítono - Daniel Hope, violino - Bengt Forsberg e Gerold Huber, piano |
Ib Hausmann, clarinete - Philip Dukes, viola - Josephine Knight, violoncelo - Bebe Risenfors, violão e acordeão |
As faixas, seus autores e intérpretes:
01 – Ich wandre durch
Theresienstadt
Anne-Sophie von Otter, Bengt
Forsberg, Bebe Risenfors
Karel ŠVENK (1917-1945)
arranjo de Moshe Zorman
02 – Pod destnikem
03 – Vsecho jde!
Anne Sofie von Otter, Bengt
Forsberg, Bebe Risenfors
Ilse WEBER
04 – Ade, Kamerad!
Christian Gerhaher, Gerold
Huber
05 – Und die Regen rinnt
Anne Sofie von Otter, Bengt
Forsberg
Adolf STRAUSS (1902-1944)
arranjo de Moshe Zorman
06 – Ich weiß bestimmt, ich werd Dich
Anne Sofie von Otter, Bengt
Forsberg
Emmerich KÁLMÁN (1882-1953)
07 – Gräfin Mariza – Opereta
em três atos: Terezín-Lied
Christian Gerhaher, Gerold
Huber
Martin ROMAN (1910-1996)
08 – Karrussell
Anne Sofie von Otter, Bengt
Forsberg
Ilse WEBER
09 – Wiegala
Anne Sofie von Otter, Bebe
Risenfors
Hans KRÁSA (1899-1944)
Três Canções sobre poemas de
Arthur Rimbaud, traduzidas por Vítězslav Nezval:
10 – Čtyřverší
11 – Vzrušení
12 – Přátelé
Christian Gerhaher, Ib
Hausmann, Philip Dukes, Josephine Knight
Carlo Sigmund TAUBE
(1897-1944)
13 – Ein jüdisches Kind
Anne Sofie von Otter, Bengt
Forsberg, Ib Hausmann
Viktor ULLMAN (1898-1944)
14 – Drei jiddische Lieder
(Brezulinka), Op.53 – no. 1: Berjoskele
Anne Sofie von Otter, Bengt Forsberg
Seis Sonetos de Louize
Labané, Op.34
15 – No. 1: “Claire Vénus”
16 – No. 2: “On voit mourir”
17 – No. 3: “Je vis, je
meurs…”
Anne Sofie von Otter, Bengt
Forsberg
Pavel HAAS (1899-1944)
Quatro Canções sobre Poemas
Chineses
18 – Zaslechl jsem divoké husy
19 – V bambusovém háji
20 – Daleko měsíc je domova
21 – Probděná noc
Christian Gerhaher, Gerold
Huber
Erwin Schulhoff [Ervín
ŠULHOV] (1894-1942)
Sonata para violino solo
(1927)
22 – Allegro con fuoco
23 – Andante cantabile
24 – Scherzo
25 – Finale
Daniel Hope
Carlo Sigmund Taube - Viktor Ullman - Pavel Haas - Erwin Schulhoff |
Acesse também ao site do Museu Judaico de Praga http://www.jewishmuseum.cz/en/explore/permanent-collection/children-s-drawings-from-the-terezin-ghetto-1942-1944/