"Ele ouvia as vozes dos
anjos e anotava suas músicas. Mas logo os anjos se transformaram em
demônios".
A frase, dita por um amigo do compositor, define aquela que foi
a maior batalha de Robert Alexander Schumann durante toda a vida: a luta contra
a loucura. Bem poucos artistas encarnaram o espírito do romantismo tão bem
quanto ele.
Schumann-Haus, Zwickau |
Nascido praticamente dentro
de uma livraria, na casa que hoje é o museu Schumann-Haus, em Zwickau no Reino
da Saxônia, atual Alemanha, no dia 8 de junho de 1.810, foi o quinto e o último
filho de Friedrich August Schumann, um livreiro, editor e romancista, e de Johanna
Christina Schumann, seus irmãos eram: Emilie (1796–1825), Eduard (1799–1839)
, Carl (1801–1849) e Julius (1805–1833).
Graças à profissão do pai teve
acesso ao melhor da literatura da época, obras de Schiller, Goethe,
Shakespeare, Lord Byron, E. T. A. Hoffman, Walter Scott e Johann Paul Friedrich
Richter, autores foram fontes de inspiração em sua obra musical.
Intitulado como o Chopin
alemão, Schumann é conhecido principalmente por suas composições para piano e
suas canções, compositor típico do romantismo alemão. A tragédia romântica foi
seu tema não só como artista, mas marcou também sua vida.
Johann Gottfried Kuntsch |
Seu primeiro contato com a
música foi aos sete anos quando passou a ter aulas de piano com Johann Gottfried Kuntsch, um autodidata que
lecionava no liceu e tocava órgão na igreja de Santa Maria. Meses mais tarde,
Robert já escrevia pequenas danças.
Aos dez anos foi transferido
para o Liceu de Zwickau, onde permaneceu até 1828. Aos doze anos, Robert havia
concluído a primeira das suas composições e havia formado um pequeno conjunto
com seus amigos de escola (dois violinos, duas flautas, duas trompas e um
clarinete) para tocar na escola e nas casas de família.
Schumann teve uma educação bastante abrangente, aprendeu latim, grego e francês, era apreciador da
literatura grega e latina.
Suas aulas de música haviam
sido interrompidas quando aos quinze anos, seu mestre Kuntzch reconheceu nada
mais ter a lhe ensinar.
O ano seguinte, 1826, marca a
sua vida por duas grandes perdas, sua irmã Emilie, num acesso de loucura, suicidou-se
e seu pai, cuja saúde não caminhava bem, não suportou o choque e faleceu no
mesmo ano. Robert entregou-se à melancolia, à passividade, a pressentimentos
mórbidos.
Leipzig - década de 1820 |
Após formar-se no ensino
médio, sua mãe decidiu que ele deveria estudar Direito, assim em 29 de março de
1828, Schumann se matriculou na Universidade de Leipzig, na capital do Reino da Saxônia.
Ocorre que a capital era desde
Johann Sebastian Bach, um centro do que havia de melhor na música alemã, sendo
reconhecida como Hauptstadt der deutschen Musik, a Capital da Música Germânica.
Friedrich Wieck |
Método Logier |
Schumann conheceu na casa do
professor Ernst August Carus: Friedrich Wieck, um autodidata em piano, teoria
da composição e educação musical e professor de piano com uma excelente
reputação.
Sua abordagem, seguindo o método de Bernhard Logier, consistia na
combinação de tocar piano e técnica, bem como uma educação básica em teoria
musical.
O mestre tinha como sua aluna
mais bem sucedida sua filha Clara, uma pianista-prodígio, que Schumann viu pela
primeira vez em 31 de março de 1828.
Heinrich Dorn |
No mesmo período, estudou
composição com Heinrich Ludwig Egmont Dorn, mestre de capela da catedral de Leipzig, recebendo
como principais influências as obras de Mozart, Schubert e Beethoven, dentre
outros.
"Minha vida tem sido uma
luta entre a poesia e a prosa, ou, se quiseres, entre a música e o direito.
Agora estou em uma encruzilhada e a questão para onde ir, me assusta".
Escreveu em uma correspondência à sua mãe.
Preocupada Johana entrou em
contato com Wieck que teria afirmado:
"Comprometo-me, minha
senhora, a fazer de seu filho Robert, em menos de três anos, graças ao seu talento
e à sua imaginação, um dos maiores pianistas vivos, mais espiritual e ardoroso
que Mocheles, mais magnífico que Hummel."
Com isso teve a aprovação
materna para seguir com a música em detrimento ao direito.
Niccolò Paganini |
Nos meses seguintes, surgiram
as primeiras obras primas de Schumann: Variações sobre o Nome Abbeg, Papillons.
No estudo de piano, seu progresso era enorme, seria um virtuose.
Após assistir em Abril de
1830, com dois amigos em Frankfurt um concerto de Niccolò Paganini, viu-se
impactado em dois aspectos: "Paganini despertou o máximo para a
diligência" na prática do piano, e Schumann planejou variações virtuosas
no La Campanella de Paganini, do qual apenas alguns esboços foram preservados.
Neue Zeitschrift für Musik |
Ambicionado por adquirir a virtuosidade
nas mãos, utiliza um aparelho chamado quiroplasto. O constante uso do apetrecho
e o excesso de horas de estudos diários, na primavera de 1832, tornou
paralítico para sempre, de um dos dedos da mão direita, com isso a história da
música perdeu um intérprete e ganhou um grande compositor.
Desta forma, dedicou-se a
composição e na produção de textos sobre música. Em 1834, fundou a revista
"Neue Zeitschrift für Musik" (Nova Revista para a Música), com amigos
e intelectuais da época, onde publicava artigos sobre os principais
compositores e intérpretes alemães da época, e promovia novos artistas, dentre
eles Brahms, que se tornou um grande amigo e quase um membro de sua família.
Ernestine von Fricken |
Ainda naquele ano, ficou
noivo de Ernestine von Fricken, porém rompeu o noivado antes do final de um
ano, dedicou a jovem senhora, uma de suas obras-primas, Carnaval.
Clara Wieck após várias
excursões como pianista retorna de Paris em abril de 1835, contando dezesseis
anos. O amor entre Robert e Clara despontava definitivamente.
O pai da jovem se
opôs ao romance entre eles, visto que o talento da filha seria desperdiçado.
Para
evitar e afastar o casal, Clara foi para Dresden e proibida de qualquer forma
de se comunicar com compositor.
Teve início um conflito
judicial, encerrado em 1.840, quando Clara completou 21 anos e quando conseguiu
a permissão nos tribunais para se casar com Schumann, o que aconteceu em 12 de
setembro.
Em um de seus anos mais
produtivos, 1840, ele compôs 168 lieder, boa parte delas apresentadas ao
público pelo amigo e também compositor Felix Mendelssohn, regente da
Gewandhaus, a magnífica sala de espetáculos de Leipzig.
Grande parte das
canções foi feita sobre poemas de Heine. Os mais belos são os que pertencem ao
Ciclo Eichendorff.
O relacionamento do casal,
além de oito filhos, rendeu 20 mil cartas trocadas, os problemas de uma família
normal não impediram que os dois trabalhassem ativamente: ele compondo e ela se
apresentando nos principais centros europeus. Devido a sua carreira de
concertista, Clara gozava de muito maior renome do que ele. Tratado muitas
vezes como "marido de Clara Wieck".
Schumann-Haus em Leipzig |
O casal viveu por quatro anos
em Leipzig, tempo inspirador para Schumann que compôs diversos ciclos de
canções, quartetos de cordas, peças pianísticas, as primeiras sinfonias e o
Concerto para piano em Lá menor, entre outras obras. A casa em Leipzig onde
viveram de 1840 a 1844 hoje é um museu, espaço para eventos e escola - a
"Schumann-Haus".
A popularidade de sua música,
no entanto, era restrita: Beethoven e Chopin correspondiam mais ao gosto da
época, e diante disso, Clara executava suas obras, algumas vezes no “bis” em
seus recitais.
Conservatório de Leipzig |
Em 1843, a convite de
Mendelssohn, Schumann foi contratado para dar aulas no Conservatório de
Leipzig, mas não se revelou um bom professor. Viajou para a Rússia em companhia
da esposa e, quando retornou ao reino, os distúrbios psíquicos tornaram-se mais
graves.
A partir de 1845, a qualidade
das obras de Schumann começou a cair.
Schumann mudou-se com sua
família para a Renânia em 1850, onde assumiu o cargo de diretor musical em
Düsseldorf.
Schumann teve graves problemas com os músicos, devido a sua
estabilidade emocional. Em 1853, começa a ter alucinações auditivas, ouvindo
incessantemente a nota "lá"; a isso se juntava a dificuldade de fala
e a melancolia.
No início do ano seguinte, as
alucinações tornam-se cada vez mais frequentes e, nos momentos de lucidez, é
tomado pelo temor de se tornar completamente louco.
Na noite 17 de fevereiro de
1854, Schumann se levanta de seu leito, atormentado e insone, para escrever um
tema ditado por anjos que via ao seu redor. Mas, aos poucos, essas figuras
celestiais se transformam em demônios em forma de hiena e de tigre. E essas
novas visões são acompanhadas de uma música tenebrosa e assustadora.
Manicômio de Endenich |
Em 27 de fevereiro de 1854,
atirou-se no Rio Reno.
Foi salvo por um grupo de barqueiros, mas, por vontade
própria pede para ser internado num asilo de alienados, foi encaminhado para um
manicômio em Endenich, próximo a Bonn, de onde jamais sairia.
Foi diagnosticado
com “melancolia psicótica”.
Proibido de encontrar a
esposa, recebe frequentemente a visita de amigos. Para Clara, envia cartas que
testemunham o seu amor até o fim: "Oh! se eu pudesse te rever, falar-te
mais uma vez". A 23 de julho de 1856, cessa toda a alimentação. Chamada às
pressas, Clara testemunha seus últimos momentos de consciência: "Ele me
sorriu e com grande esforço me enlaçou em seus braços. Eu não trocaria esse
abraço por todos os tesouros do mundo".
Morreu ao lado da esposa,
Clara, e do amigo e discípulo Brahms, no dia 29 de julho de 1.856.
Clara Wieck Schumann |
Os pesquisadores Eliot
Slater, Alfred Meyer e Eric Sams afirmam que a demência de Schumann seria
decorrente de uma mal curada sífilis terciária, que o próprio compositor
admitiu ter contraído em seus anos de juventude.
Clara Schumann retomou a
carreira de pianista, falecendo aos 77 anos em Frankfurt.
Robert Schumann não foi
devidamente reconhecido em vida. Apenas depois de sua morte tornou-se um dos
compositores mais queridos do público, influenciando César Franck, Alexander
Borodin, Antonin Dvorak e Edvard Grieg.
Schumann correspondeu aos
parâmetros do romantismo, nos quais amores impossíveis se alternavam com
insanidade, delírios e atração pela morte.
Schumann também foi excelente
crítico de música. Foi severo com Rossini e Meyerbeer, reconheceu o valor de
Mendelssohn, descobriu obras inéditas de Schubert, saudou devidamente Chopin e
adivinhou o gênio de Brahms.
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