quinta-feira, 9 de junho de 2016

Assim falou Zaratustra

Nietzsche


Richard Strauss compôs a peça no ano de 1896. É um dos primeiros trabalhos feitos para homenagear Nietzsche, embora este estivesse com uma paralisia geral nessa época. Mas, ele deve ter ouvido as notícias referentes a essa homenagem feito pelo compositor.

Richard Strauss

Poema Sinfônico "Assim falou Zaratustra" (Also sprach Zarathustra)

Seu número de catálogo é Opus 30 / TrV 176 - escrita durante o período de 4 de fevereiro a 24 de agosto de 1896. A obra teve a sua estreia no dia 27 de novembro de 1896 em Frankfurt — Frankfurter Opern- und Museumsorchester, com a regência do próprio autor.

O Poema Sinfônico tem inspiração na obra literária homônima de Friedrich Nietzsche, de 1885, que conta a trajetória de Zaratustra, ou Zoroastro, o profeta persa (século VII aC) que desce de seu refúgio solitário na montanha e vai compartilhar seu conhecimento com a humanidade. 
Valendo-se da voz de Zaratustra, Nietzsche denuncia o servilismo à religião e os abusos da sociedade contra o indivíduo. A idéia central do livro é a de que somos seres em transição, do macaco ao que o autor chamou de übermensch, o homem-além-do-homem (ou simplesmente traduzido como super-homem). 


Kubrick
Tal teoria foi inserida por Stanley Kubrick em seu filme "2001, Uma odisseia no espaço" de 1968, e a utilização da música na trilha-sonora conferiu à obra uma imensa popularidade.


Strauss declarou que não foi sua intenção produzir música filosófica, nem muito menos traduzir musicalmente o livro, mas sim homenagear a grande figura de Niezsche e sua obra-prima. As 9 partes são, segundo o compositor, um panorama do desenvolvimento da raça humana desde sua origem, passando pelo contato com a religião, com a ciência, até atingir a figura nietzschiana do übermensch.

A peça utiliza os seguintes instrumentos para sua execução:
A disposição aproximada da orquestra seria está, acrescentando e substituindo alguns instrumentos, tais como o piano pelo órgão, os oboés entrariam próximos aos fagotes e saem a corneta, gongo, caixa e xilofone.

Órgão, 1 Flautim, 3 Flautas, 3 Oboés, 1 Corne-inglês, 3 Clarinetas, 1 Clarineta-baixo, 3 Fagotes, 1 Contrafagote, 6 Trompas, 4 Trompetes, 3 Trombones, 2 Tubas, Tímpanos, 1 Bumbo, Címbalos, Triângulo, Glockenspiel, Carrilhão ou sino, 2 Harpas, e 64 Cordas (16 primeiros-violinos, 16 segundos-violinos, 12 violas, 12 violoncelos e 8 contra-baixos).

Com duração aproximada de 35 minutos, divididos em nove partes, que são tocadas ininterruptamente. Segue comentário e a duração aproximada de cada uma delas:


I. Einleitung, oder Sonnenaufgang
(Introdução, ou O Nascer do Sol) — cerca de 2 minutos
O impacto indescritível disso que seria o contato do homem com o poder de Deus (no programa da estreia em Berlim escrito pelo próprio autor) é construído sobre uma nota grave sustentada pelo órgão, com ajuda dos contrabaixos e do contrafagote, no qual irá se apoiar o inesquecível chamado de 3 notas dos trompetes, complementado pela marcação contundente dos tímpanos. O sol nasce e o homem se confronta com a dor do conhecimento, a certeza da morte.
Instrumentos com destaque na primeira parte. 

II. Von den Hinterweltlern
(Dos habitantes dos mundos ocultos) — cerca de 3 minutos
Originalmente, Strauss intitulou essa passagem como Von Göttlichen, Do Divino, e aqui a música traduz a primeira tentativa do homem em encontrar respostas para os mistérios, apelando para as "verdades" religiosas. Um doce tema nasce nos violoncelos e espalha-se pelas cordas com ecos do canto medieval "Credo in unum Deum" (Cremos em um só Deus).


Violencelo e as demais cortas dominam a segunda parte.


III. Von der großen Sehnsucht
(Do imenso desejo) — cerca de 2 minutos
A tentativa de encontrar conforto na saciedade de seus instintos. As cordas "deslizam" com o tema do desejo e são sistematicamente interrompidas pelos sopros com uma sonoridade sôfrega e desconfortável. No ápice melódico, uma brutal interferência que enuncia a dúvida e prepara o próximo trecho.

IV. Von den Freuden und Leidenschaften
(Das alegrias e das paixões) — cerca de 2 minutos
A revolta do homem frente à falta de respostas e sua entrega às paixões, numa melodia gloriosa nos violinos que simboliza os prazeres carnais, até culminar num comentário jocoso dos trombones simbolizando o fastio.

V. Das Grablied
(A canção do túmulo) — cerca de 2 minutos e meio
O sentimento de impotência e desolação, o desespero do homem (numa melodia que aparece no violino-solo do spalla) frente à invencível morte.




VI. Von der Wissenschaft
(Da ciência) — cerca de 4 minutos
Começa numa passagem sombria, na qual o homem tenta, outra vez, encontrar respostas, agora nas ciências e no aprendizado. Adiante os sopros saltitam, simbolizando o conhecimento, e o tema principal ecoa em confronto.

VII. Der Genesende
(O Convalescente) — cerca de 5 minutos
O movimento trata da ascensão do homem a super-homem, libertando-se do mal e da ignorância. Os temas anteriores retornam, inebriados pela atmosfera da superação dos desejos terrenos. A fanfarra pontua a presença de Zaratustra, que ri extasiado (repiques do oboé) e comemora seu triunfo.
oboé

VIII. Das Tanzlied
(A Canção dançante) — cerca de 8 minutos
Volúpia e felicidade na melodia valsante trazida pelo primeiro-violino, num movimento que vai acumulando tensão em direção ao êxtase triunfal que aos poucos vai se desfazendo até o movimento de conclusão:

IX. Nachtwandlerlied
(Canto do viajante noturno) — cerca de 5 minutos
O sino convida às profundezas da noite. É um “finale” enigmático, deixando "o problema" do homem não resolvido. Ecoa o Universo, as esferas, como se o homem fosse se diluir na matéria da qual ele se destacou. A atmosfera permanece serena mais ainda ambígua, cheia de interrogações. Simbolizando essa dúvida, uma dissonância entre o flautim e os violinos antecede a finalização da peça em suaves pizzicatos.
flautim


Texto de Rafael Fonseca.



A peça apresentada nesta postagem é dirigida pelo maestro letão Maris Jansons a frente da Bavarian Radio Symphony Orchestra.



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